sexta-feira, 16 de março de 2012

Mentir: até quando é normal?

Quem nunca contou uma mentirinha no trabalho ou então para os amigos? Segundo a psicóloga Érika Vendramini, todos mentem e a mentira não apenas é considerada normal, como necessária para a vida em sociedade, por isso não se pode considerar todas as mentiras da mesma forma e com a mesma culpa. "Na psicologia a mentira em si não é suficiente para definir um quadro clínico. No entanto, como qualquer outro comportamento, se for excessivo e se causar prejuízo ou sofrimento (ao mentiroso ou ao outro), pode-se dizer que o mentir é patológico. Além disso, deve-se levar em consideração os sentimentos, pensamentos e propósitos que acompanham a mentira", diz ela.

De acordo com a psicóloga, existem vários tipos de mentiras. A chamada "mentira convencional" é aquela que faz as pessoas dizerem "Bom dia" às outras, sem que se esteja realmente desejando que elas tenham um bom dia. Existe ainda a "mentira carinhosa", que faz os adultos inventarem histórias como o Papai Noel para alegrar as crianças. Ou um tipo de mentira bondosa que consola um familiar à beira da morte, com um "Vai ficar tudo bem!". Ou ainda a chamada "mentira branca", quando, por exemplo, alguém pergunta se a outra pessoa gostou do seu novo corte de cabelo e essa diz que sim, mesmo não tendo gostado. Nesse caso a verdade seria uma tremenda grosseria e não traria benefício nenhum.

Além dessas mentiras sociais, também existem aqueles que floreiam uma história ao contá-las, para torná-la mais engraçada ou para atrair a atenção dos espectadores. "Todas essas mentiras são comuns e não são consideradas ruins justamente por serem esporádicas e não causarem prejuízo ao outro", diz a psicóloga.

Segundo ela, a mentira patológica é o contrário disso: quando causa prejuízo a alguém ou quando a pessoa mente sistematicamente. "As pessoas que têm o costume de mentir, sempre aumentando suas histórias, ou contando fatos que não ocorreram, acabam se enredando numa teia de mentiras para sustentar uma mentira inicial. Isso acaba por provocar grande desconforto a elas mesmas e àqueles que estão próximos", explica ela.

Nesses casos, segundo Érika, a pessoa tem consciência da mentira e continua mentindo. Ela dá um exemplo: "Imagine um mentiroso inseguro numa roda de conversa entre profissionais bem-sucedidos. Ele pode inventar que fez determinada faculdade para sentir-se no mesmo nível intelectual que os outros, ainda que tenha feito apenas um curso técnico. À medida que a conversa se estende e ele for questionado sobre onde fez faculdade, se teve aula com fulano, ou se conheceu sicrano, as mentiras vão se tornando cada vez maiores para sustentar a mentira inicial e ele não ser desmascarado".

Os motivos que levam uma pessoa a mentir sem limites são vários, dentre eles, insegurança, baixa autoestima, ou medo de não ser aceita como é. A psicóloga explica que essas mentiras costumam engrandecer suas habilidades de forma a passar uma imagem que ela julga melhor, aos outros. Trata-se de uma espécie de mecanismo de defesa contra um sentimento de inferioridade. Mente-se também para evitar consequências negativas às atitudes, ou seja, para evitar responder por alguma atitude errada que a pessoa tomou.

Érika chama atenção também para o fato de que algumas famílias estimulam a mentira. "Pode parecer banal, mas a mãe que pede ao filho para dizer que ela está tomando banho, quando na verdade não quer atender ao telefone, ou inventa uma doença para emendar o feriado e não ir trabalhar, está ensinando a criança a mentir. Também há casos de mentiras excessivas em famílias cujos pais são muito autoritários, repreensivos ou rígidos. A criança aprende a mentir para não ser punida ou para receber aprovação", explica.

Para as pessoas que sofrem disso, a psicoterapia é uma boa alternativa, pois assim o paciente poderá entender os motivos que a levam a mentir, e trabalhar uma possível insegurança ou baixa autoestima. Uma dica dada pela psicóloga para quem conhece uma pessoa que mente compulsivamente é mostrar que sabe que ela está mentindo, mas sem condená-la por isso. "Pode dizer que a ama e aceita exatamente como ela é, com suas qualidades e defeitos, sem precisar usar de artifícios. Demonstrar humildade assumindo os próprios erros também pode fazê-la enxergar que todos temos defeitos, todos erramos e que não há motivo para se envergonhar disso. E, por fim, mostrar o quanto ela se prejudica com as mentiras e até sugerir que ela procure um psicólogo também pode ser altamente benéfico", finaliza ela.